Para as turmas CA1 e CB1
Fragmento do MANUAL
DE REDAÇÃO DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
1. O que é Redação Oficial
Em uma frase, pode-se dizer que redação oficial é a maneira pela qual o Poder Público redige atos normativos e comunicações. Interessa-nos tratá-la do ponto de vista do Poder Executivo.
A redação oficial deve caracterizar-se pela impessoalidade, uso do padrão culto de linguagem, clareza, concisão, formalidade e uniformidade. Fundamentalmente esses atributos decorrem da Constituição, que dispõe, no artigo 37: "A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)". Sendo a publicidade e a impessoalidade princípios fundamentais de toda administração pública, claro está que devem igualmente nortear a elaboração dos atos e comunicações oficiais.
Não se concebe que um ato normativo de qualquer natureza seja redigido de forma obscura, que dificulte ou impossibilite sua compreensão. A transparência do sentido dos atos normativos, bem como sua inteligibilidade, são requisitos do próprio Estado de Direito: é inaceitável que um texto legal não seja entendido pelos cidadãos. A publicidade implica, pois, necessariamente, clareza e concisão.
Além de atender à disposição constitucional, a forma dos atos normativos obedece a certa tradição. Há normas para sua elaboração que remontam ao período de nossa história imperial, como, por exemplo, a obrigatoriedade – estabelecida por decreto imperial de 10 de dezembro de 1822 – de que se aponha, ao final desses atos, o número de anos transcorridos desde a Independência. Essa prática foi mantida no período republicano.
Esses mesmos princípios (impessoalidade, clareza, uniformidade, concisão e uso de linguagem formal) aplicam-se às comunicações oficiais: elas devem sempre permitir uma única interpretação e ser estritamente impessoais e uniformes, o que exige o uso de certo nível de linguagem.
Nesse quadro, fica claro também que as comunicações oficiais são necessariamente uniformes, pois há sempre um único comunicador (o Serviço Público) e o receptor dessas comunicações ou é o próprio Serviço Público (no caso de expedientes dirigidos por um órgão a outro) – ou o conjunto dos cidadãos ou instituições tratados de forma homogênea (o público).
Outros procedimentos rotineiros na redação de comunicações oficiais foram incorporados ao longo do tempo, como as formas de tratamento e de cortesia, certos clichês de redação, a estrutura dos expedientes, etc. Mencione-se, por exemplo, a fixação dos fechos para comunicações oficiais, regulados pela Portaria no 1 do Ministro de Estado da Justiça, de 8 de julho de 1937, que, após mais de meio século de vigência, foi revogado pelo Decreto que aprovou a primeira edição deste Manual.
Acrescente-se, por fim, que a identificação que se buscou fazer das características específicas da forma oficial de redigir não deve ensejar o entendimento de que se proponha a criação – ou se aceite a existência – de uma forma específica de linguagem administrativa, o que coloquialmente e pejorativamente se chama burocratês. Este é antes uma distorção do que deve ser a redação oficial, e se caracteriza pelo abuso de expressões e clichês do jargão burocrático e de formas arcaicas de construção de frases.
A redação oficial não é, portanto, necessariamente árida e infensa à evolução da língua. É que sua finalidade básica – comunicar com impessoalidade e máxima clareza – impõe certos parâmetros ao uso que se faz da língua, de maneira diversa daquele da literatura, do texto jornalístico, da correspondência particular, etc.
Apresentadas essas características fundamentais da redação oficial, passemos à análise pormenorizada de cada uma delas.
A finalidade da língua é comunicar, quer pela fala, quer pela escrita. Para que haja comunicação, são necessários: a) alguém que comunique, b) algo a ser comunicado, e c) alguém que receba essa comunicação. No caso da redação oficial, quem comunica é sempre o Serviço Público (este ou aquele Ministério, Secretaria, Departamento, Divisão, Serviço, Seção); o que se comunica é sempre algum assunto relativo às atribuições do órgão que comunica; o destinatário dessa comunicação ou é o público, o conjunto dos cidadãos, ou outro órgão público, do Executivo ou dos outros Poderes da União.
Percebe-se, assim, que o tratamento impessoal que deve ser dado aos assuntos que constam das comunicações oficiais decorre:
a) da ausência de impressões individuais de quem comunica: embora se trate, por exemplo, de um expediente assinado por Chefe de determinada Seção, é sempre em nome do Serviço Público que é feita a comunicação. Obtém-se, assim, uma desejável padronização, que permite que comunicações elaboradas em diferentes setores da Administração guardem entre si certa uniformidade;
b) da impessoalidade de quem recebe a comunicação, com duas possibilidades: ela pode ser dirigida a um cidadão, sempre concebido como público, ou a outro órgão público. Nos dois casos, temos um destinatário concebido de forma homogênea e impessoal;
c) do caráter impessoal do próprio assunto tratado: se o universo temático das comunicações oficiais se restringe a questões que dizem respeito ao interesse público, é natural que não cabe qualquer tom particular ou pessoal.
Desta forma, não há lugar na redação oficial para impressões pessoais, como as que, por exemplo, constam de uma carta a um amigo, ou de um artigo assinado de jornal, ou mesmo de um texto literário. A redação oficial deve ser isenta da interferência da individualidade que a elabora.
A concisão, a clareza, a objetividade e a formalidade de que nos valemos para elaborar os expedientes oficiais contribuem, ainda, para que seja alcançada a necessária impessoalidade.
A necessidade de empregar determinado nível de linguagem nos atos e expedientes oficiais decorre, de um lado, do próprio caráter público desses atos e comunicações; de outro, de sua finalidade. Os atos oficiais, aqui entendidos como atos de caráter normativo, ou estabelecem regras para a conduta dos cidadãos, ou regulam o funcionamento dos órgãos públicos, o que só é alcançado se em sua elaboração for empregada a linguagem adequada. O mesmo se dá com os expedientes oficiais, cuja finalidade precípua é a de informar com clareza e objetividade.
As comunicações que partem dos órgãos públicos federais devem ser compreendidas por todo e qualquer cidadão brasileiro. Para atingir esse objetivo, há que evitar o uso de uma linguagem restrita a determinados grupos. Não há dúvida que um texto marcado por expressões de circulação restrita, como a gíria, os regionalismos vocabulares ou o jargão técnico, tem sua compreensão dificultada.
Ressalte-se que há necessariamente uma distância entre a língua falada e a escrita. Aquela é extremamente dinâmica, reflete de forma imediata qualquer alteração de costumes, e pode eventualmente contar com outros elementos que auxiliem a sua compreensão, como os gestos, a entoação, etc., para mencionar apenas alguns dos fatores responsáveis por essa distância. Já a língua escrita incorpora mais lentamente as transformações, tem maior vocação para a permanência, e vale-se apenas de si mesma para comunicar.
A língua escrita, como a falada, compreende diferentes níveis, de acordo com o uso que dela se faça. Por exemplo, em uma carta a um amigo, podemos nos valer de determinado padrão de linguagem que incorpore expressões extremamente pessoais ou coloquiais; em um parecer jurídico, não se há de estranhar a presença do vocabulário técnico correspondente. Nos dois casos, há um padrão de linguagem que atende ao uso que se faz da língua, a finalidade com que a empregamos.
O mesmo ocorre com os textos oficiais: por seu caráter impessoal, por sua finalidade de informar com o máximo de clareza e concisão, eles requerem o uso do padrão culto da língua. Há consenso de que o padrão culto é aquele em que a) se observam as regras da gramática formal, e b) se emprega um vocabulário comum ao conjunto dos usuários do idioma. É importante ressaltar que a obrigatoriedade do uso do padrão culto na redação oficial decorre do fato de que ele está acima das diferenças lexicais, morfológicas ou sintáticas regionais, dos modismos vocabulares, das idiossincrasias lingüísticas, permitindo, por essa razão, que se atinja a pretendida compreensão por todos os cidadãos.
Lembre-se que o padrão culto nada tem contra a simplicidade de expressão, desde que não seja confundida com pobreza de expressão. De nenhuma forma o uso do padrão culto implica emprego de linguagem rebuscada, nem dos contorcionismos sintáticos e figuras de linguagem próprios da língua literária.
Pode-se concluir, então, que não existe propriamente um "padrão oficial de linguagem"; o que há é o uso do padrão culto nos atos e comunicações oficiais. É claro que haverá preferência pelo uso de determinadas expressões, ou será obedecida certa tradição no emprego das formas sintáticas, mas isso não implica, necessariamente, que se consagre a utilização de uma forma de linguagem burocrática. O jargão burocrático, como todo jargão, deve ser evitado, pois terá sempre sua compreensão limitada.
A linguagem técnica deve ser empregada apenas em situações que a exijam, sendo de evitar o seu uso indiscriminado. Certos rebuscamentos acadêmicos, e mesmo o vocabulário próprio a determinada área, são de difícil entendimento por quem não esteja com eles familiarizado. Deve-se ter o cuidado, portanto, de explicitá-los em comunicações encaminhadas a outros órgãos da administração e em expedientes dirigidos aos cidadãos.
Outras questões sobre a linguagem, como o emprego de neologismo e estrangeirismo, são tratadas em detalhe em 9.3. Semântica.
As comunicações oficiais devem ser sempre formais, isto é, obedecem a certas regras de forma: além das já mencionadas exigências de impessoalidade e uso do padrão culto de linguagem, é imperativo, ainda, certa formalidade de tratamento. Não se trata somente da eterna dúvida quanto ao correto emprego deste ou daquele pronome de tratamento para uma autoridade de certo nível (v. a esse respeito 2.1.3. Emprego dos Pronomes de Tratamento); mais do que isso, a formalidade diz respeito à polidez, à civilidade no próprio enfoque dado ao assunto do qual cuida a comunicação.
A formalidade de tratamento vincula-se, também, à necessária uniformidade das comunicações. Ora, se a administração federal é una, é natural que as comunicações que expede sigam um mesmo padrão. O estabelecimento desse padrão, uma das metas deste Manual, exige que se atente para todas as características da redação oficial e que se cuide, ainda, da apresentação dos textos.
A clareza datilográfica, o uso de papéis uniformes para o texto definitivo e a correta diagramação do texto são indispensáveis para a padronização. Consulte o Capítulo II, As Comunicações Oficiais, a respeito de normas específicas para cada tipo de expediente.
A concisão é antes uma qualidade do que uma característica do texto oficial. Conciso é o texto que consegue transmitir um máximo de informações com um mínimo de palavras. Para que se redija com essa qualidade, é fundamental que se tenha, além de conhecimento do assunto sobre o qual se escreve, o necessário tempo para revisar o texto depois de pronto. É nessa releitura que muitas vezes se percebem eventuais redundâncias ou repetições desnecessárias de idéias.
O esforço de sermos concisos atende, basicamente ao princípio de economia lingüística, à mencionada fórmula de empregar o mínimo de palavras para informar o máximo. Não se deve de forma alguma entendê-la como economia de pensamento, isto é, não se devem eliminar passagens substanciais do texto no afã de reduzi-lo em tamanho. Trata-se exclusivamente de cortar palavras inúteis, redundâncias, passagens que nada acrescentem ao que já foi dito.
Procure perceber certa hierarquia de idéias que existe em todo texto de alguma complexidade: idéias fundamentais e idéias secundárias. Estas últimas podem esclarecer o sentido daquelas, detalhá-las, exemplificá-las; mas existem também idéias secundárias que não acrescentam informação alguma ao texto, nem têm maior relação com as fundamentais, podendo, por isso, ser dispensadas.
A clareza deve ser a qualidade básica de todo texto oficial, conforme já sublinhado na introdução deste capítulo. Pode-se definir como claro aquele texto que possibilita imediata compreensão pelo leitor. No entanto a clareza não é algo que se atinja por si só: ela depende estritamente das demais características da redação oficial. Para ela concorrem:
a) a impessoalidade, que evita a duplicidade de interpretações que poderia decorrer de um tratamento personalista dado ao texto;
b) o uso do padrão culto de linguagem, em princípio, de entendimento geral e por definição avesso a vocábulos de circulação restrita, como a gíria e o jargão;
c) a formalidade e a padronização, que possibilitam a imprescindível uniformidade dos textos;
d) a concisão, que faz desaparecer do texto os excessos lingüísticos que nada lhe acrescentam.
É pela correta observação dessas características que se redige com clareza. Contribuirá, ainda, a indispensável releitura de todo texto redigido. A ocorrência, em textos oficiais, de trechos obscuros e de erros gramaticais provém principalmente da falta da releitura que torna possível sua correção.
Na revisão de um expediente, deve-se avaliar, ainda, se ele será de fácil compreensão por seu destinatário. O que nos parece óbvio pode ser desconhecido por terceiros. O domínio que adquirimos sobre certos assuntos em decorrência de nossa experiência profissional muitas vezes faz com que os tomemos como de conhecimento geral, o que nem sempre é verdade. Explicite, desenvolva, esclareça, precise os termos técnicos, o significado das siglas e abreviações e os conceitos específicos que não possam ser dispensados.
A revisão atenta exige, necessariamente, tempo. A pressa com que são elaboradas certas comunicações quase sempre compromete sua clareza. Não se deve proceder à redação de um texto que não seja seguida por sua revisão. "Não há assuntos urgentes, há assuntos atrasados", diz a máxima. Evite-se, pois, o atraso, com sua indesejável repercussão no redigir.
Por fim, como exemplo de texto obscuro, que deve ser evitado em todas as comunicações oficiais, transcrevemos a seguir um pitoresco quadro, constante de obra de Adriano da Gama Kury , a partir do qual podem ser feitas inúmeras frases, combinando-se as expressões das várias colunas em qualquer ordem, com uma característica comum: nenhuma delas tem sentido! O quadro tem aqui a função de sublinhar a maneira de como não se deve escrever:
Como não se deve escrever:
COLUNA A
|
COLUNA B
|
COLUNA C
|
COLUNA D
|
COLUNA E
|
COLUNA F
|
COLUNA G
|
1. A necessidade emergente | se caracteriza por | uma correta relação entre estrutura e superestrutura | no interesse primário da população, | substanciando e vitalizando, | numa ótica preventiva e não mais curativa, | a transparência de cada ato decisional. |
2. O quadro normativo | prefigura | a superação de cada obstáculo e/ou resistência passiva | sem prejudicar o atual nível das contribuições, | não assumindo nunca como implícito, | no contexto de um sistema integrado, | um indispensável salto de qualidade. |
3. O critério metodológico | reconduz a sínteses | a pontual correspondência entre objetivos e recursos | com critérios não-dirigísticos, | potenciando e incrementando, | na medida em que isso seja factível, | o aplanamento de discrepâncias e discrasias existentes. |
4. O modelo de desenvolvimento | incrementa | o redirecionamento das linhas de tendências em ato | para além das contradições e dificuldades iniciais, | evidenciando e explicitando | em termos de eficácia e eficiência, | a adoção de uma metodologia diferenciada. |
5. O novo tema social | propicia | o incorporamento das funções e a descentralização decisional | numa visão orgânica e não totalizante, | ativando e implementando, | a cavaleiro da situação contingente, | a redefinição de uma nova figura profissional. |
6. O método participativo | propõe-se a | o reconhecimento da demanda não satisfeita | mediante mecanismos da participação, | não omitindo ou calando, mas antes particularizando, | com as devidas e imprescindíveis enfatizações, | o co-envolvimento ativo de operadores e utentes. |
7. A utilização potencial | privilegia | uma coligação orgânica interdisciplinar para uma práxis de trabalho de grupo, | segundo um módulo de interdependência horizontal, | recuperando, ou antes revalorizando, | como sua premissa indispensável e condicionante, | uma congruente flexibilidade das estruturas. |
2. Introdução
A redação das comunicações oficiais deve, antes de tudo, seguir os preceitos explicitados no Capítulo I, Aspectos Gerais da Redação Oficial. Além disso, há características específicas de cada tipo de expediente, que serão tratadas em detalhe neste capítulo. Antes de passarmos à sua análise, vejamos outros aspectos comuns a quase todas as modalidades de comunicação oficial: o emprego dos pronomes de tratamento, a forma dos fechos e a identificação do signatário.
2.1.1. Breve História dos Pronomes de Tratamento
O uso de pronomes e locuções pronominais de tratamento tem larga tradição na língua portuguesa. De acordo com Said Ali, após serem incorporados ao português os pronomes latinos tu e vos, "como tratamento direto da pessoa ou pessoas a quem se dirigia a palavra", passou-se a empregar, como expediente lingüístico de distinção e de respeito, a segunda pessoa do plural no tratamento de pessoas de hierarquia superior. Prossegue o autor:
"Outro modo de tratamento indireto consistiu em fingir que se dirigia a palavra a um atributo ou qualidade eminente da pessoa de categoria superior, e não a ela própria. Assim aproximavam-se os vassalos de seu rei com o tratamento de vossa mercê, vossa senhoria (...); assim usou-se o tratamento ducal de vossa excelência e adotaram-se na hierarquia eclesiástica vossa reverência, vossa paternidade, vossa eminência, vossa santidade."
A partir do final do século XVI, esse modo de tratamento indireto já estava em voga também para os ocupantes de certos cargos públicos. Vossa mercê evoluiu para vosmecê, e depois para o coloquial você. E o pronome vós, com o tempo, caiu em desuso. É dessa tradição que provém o atual emprego de pronomes de tratamento indireto como forma de dirigirmo-nos às autoridades civis, militares e eclesiásticas.
2.1.2. Concordância com os Pronomes de Tratamento
Os pronomes de tratamento (ou de segunda pessoa indireta) apresentam certas peculiaridades quanto à concordância verbal, nominal e pronominal. Embora se refiram à segunda pessoa gramatical (à pessoa com quem se fala, ou a quem se dirige a comunicação), levam a concordância para a terceira pessoa. É que o verbo concorda com o substantivo que integra a locução como seu núcleo sintático: "Vossa Senhoria nomeará o substituto"; "Vossa Excelência conhece o assunto".
Da mesma forma, os pronomes possessivos referidos a pronomes de tratamento são sempre os da terceira pessoa: "Vossa Senhoria nomeará seu substituto" (e não "Vossa ... vosso...").
Já quanto aos adjetivos referidos a esses pronomes, o gênero gramatical deve coincidir com o sexo da pessoa a que se refere, e não com o substantivo que compõe a locução. Assim, se nosso interlocutor for homem, o correto é "Vossa Excelência está atarefado", "Vossa Senhoria deve estar satisfeito"; se for mulher, "Vossa Excelência está atarefada", "Vossa Senhoria deve estar satisfeita".
2.1.
Pronomes de Tratamento
2.1.1.
Breve História dos Pronomes de Tratamento
O
uso de pronomes e locuções pronominais de tratamento
tem larga tradição na língua portuguesa. De
acordo com Said Ali, após serem incorporados ao português
os pronomes latinos tu e vos,
"como
tratamento direto da pessoa ou pessoas a quem se dirigia a palavra",
passou-se a empregar, como expediente lingüístico de
distinção e de respeito, a segunda pessoa do plural no
tratamento de pessoas de hierarquia superior. Prossegue o autor:
"Outro
modo de tratamento indireto consistiu em fingir que se dirigia a
palavra a um atributo ou qualidade eminente da pessoa de categoria
superior, e não a ela própria. Assim aproximavam-se os
vassalos de seu rei com o tratamento de vossa mercê, vossa
senhoria (...); assim usou-se o tratamento ducal de vossa
excelência e adotaram-se na hierarquia
eclesiástica vossa reverência, vossa
paternidade, vossa eminência, vossa
santidade."
A
partir do final do século XVI, esse modo de tratamento
indireto já estava em voga também para os ocupantes de
certos cargos públicos. Vossa
mercê evoluiu
para vosmecê,
e depois para o coloquial você.
E o pronome vós,
com o tempo, caiu em desuso. É dessa tradição
que provém o atual emprego de pronomes de tratamento indireto
como forma de dirigirmo-nos às autoridades civis, militares e
eclesiásticas.
2.1.2.
Concordância com os Pronomes de Tratamento
Os
pronomes de tratamento (ou de segunda
pessoa indireta)
apresentam certas peculiaridades quanto à concordância
verbal, nominal e pronominal. Embora se refiram à segunda
pessoa gramatical (à pessoa com quem se fala, ou a quem se
dirige a comunicação), levam a concordância para
a terceira
pessoa.
É que o verbo concorda com o substantivo que integra a locução
como seu núcleo sintático: "Vossa Senhoria
nomeará o
substituto"; "Vossa Excelência
conhece o
assunto".
Da
mesma forma, os pronomes possessivos referidos a pronomes de
tratamento são sempre os da terceira pessoa:
"Vossa Senhoria nomeará seu substituto"
(e não "Vossa ... vosso...").
Já
quanto aos adjetivos referidos a esses pronomes, o gênero
gramatical deve coincidir com o sexo da pessoa a que se refere, e não
com o substantivo que compõe a locução. Assim,
se nosso interlocutor for homem, o correto é "Vossa
Excelência está atarefado",
"Vossa
Senhoria deve estar satisfeito";
se for mulher, "Vossa
Excelência está atarefada", "Vossa Senhoria
deve estar satisfeita".
2.1.3.
Emprego dos Pronomes de Tratamento
Como
visto, o emprego dos pronomes de tratamento obedece a secular
tradição. São de uso consagrado:
Vossa
Excelência,
para as seguintes autoridades:
a)
do Poder Executivo;
Presidente
da República;
Vice-Presidente
da República;
Ministros
de Estado;
Governadores
e Vice-Governadores de Estado e do Distrito Federal;
Oficiais-Generais
das Forças Armadas;
Embaixadores;
Secretários-Executivos
de Ministérios e demais ocupantes de cargos de natureza
especial;
Secretários
de Estado dos Governos Estaduais;
Prefeitos
Municipais.
b)
do Poder Legislativo:
Deputados
Federais e Senadores;
Ministro
do Tribunal de Contas da União;
Deputados
Estaduais e Distritais;
Conselheiros
dos Tribunais de Contas Estaduais;
Presidentes
das Câmaras Legislativas Municipais.
c)
do Poder Judiciário:
Ministros
dos Tribunais Superiores;
Membros
de Tribunais;
Juízes;
Auditores
da Justiça Militar.
O
vocativo a ser empregado em comunicações dirigidas aos
Chefes de Poder é Excelentíssimo
Senhor,
seguido do cargo respectivo:
Excelentíssimo
Senhor Presidente da República,
Excelentíssimo
Senhor Presidente do Congresso Nacional,
Excelentíssimo
Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal.
As
demais autoridades serão tratadas com o vocativo Senhor,
seguido do cargo respectivo:
Senhor
Senador,
Senhor
Juiz,
Senhor
Ministro,
Senhor
Governador,
No
envelope, o endereçamento das comunicações
dirigidas às autoridades tratadas por Vossa
Excelência,
terá a seguinte forma:
A
Sua Excelência o Senhor Fulano de Tal Ministro de
Estado da Justiça 70.064-900 – Brasília. DF
|
A
Sua Excelência o Senhor Senador Fulano de Tal Senado
Federal 70.165-900 – Brasília. DF
|
A
Sua Excelência o Senhor Fulano de Tal Juiz de Direito
da 10a Vara Cível Rua ABC,
no 123 01.010-000 – São Paulo.
SP
|
Em
comunicações oficiais, está abolido o uso do
tratamento digníssimo (DD),
às autoridades arroladas na lista anterior. A dignidade é
pressuposto para que se ocupe qualquer cargo público, sendo
desnecessária sua repetida evocação.
Vossa
Senhoria é
empregado para as demais autoridades e para particulares. O vocativo
adequado é:
Senhor
Fulano de Tal,
(...)
No
envelope, deve constar do endereçamento:
Ao
Senhor
Fulano de
Tal
Rua ABC,
no 123
70.123 – Curitiba. PR
Como
se depreende do exemplo acima, fica dispensado o emprego do
superlativo ilustríssimo para
as autoridades que recebem o tratamento de Vossa
Senhoria e
para particulares. É suficiente o uso do pronome de
tratamento Senhor.
Acrescente-se
que doutor não
é forma de tratamento, e sim título acadêmico.
Evite usá-lo indiscriminadamente. Como regra geral, empregue-o
apenas em comunicações dirigidas a pessoas que tenham
tal grau por terem concluído curso universitário de
doutorado. É costume designar por doutor os
bacharéis, especialmente os bacharéis em Direito e em
Medicina. Nos demais casos, o tratamento Senhor confere a
desejada formalidade às comunicações.
Mencionemos,
ainda, a forma Vossa
Magnificência,
empregada por força da tradição, em comunicações
dirigidas a reitores de universidade. Corresponde-lhe o vocativo:
Magnífico
Reitor,
(...)
Os
pronomes de tratamento para religiosos, de acordo com a hierarquia
eclesiástica, são:
Vossa
Santidade,
em comunicações dirigidas ao Papa. O vocativo
correspondente é:
Santíssimo
Padre,
(...)
Vossa
Eminência ou Vossa
Eminência Reverendíssima,
em comunicações aos Cardeais. Corresponde-lhe o
vocativo:
Eminentíssimo
Senhor Cardeal, ou
Eminentíssimo
e Reverendíssimo Senhor Cardeal,
(...)
Vossa
Excelência Reverendíssima é
usado em comunicações dirigidas a Arcebispos e
Bispos; Vossa
Reverendíssima ou Vossa
Senhoria Reverendíssima para
Monsenhores, Cônegos e superiores religiosos. Vossa
Reverência é
empregado para sacerdotes, clérigos e demais religiosos.
2.2.
Fechos para Comunicações
O
fecho das comunicações oficiais possui, além da
finalidade óbvia de arrematar o texto, a de saudar o
destinatário. Os modelos para fecho que vinham sendo
utilizados foram regulados pela Portaria no 1
do Ministério da Justiça, de 1937, que estabelecia
quinze padrões. Com o fito de simplificá-los e
uniformizá-los, este Manual estabelece o emprego de somente
dois fechos diferentes para todas as modalidades de comunicação
oficial:
a)
para autoridades superiores, inclusive o Presidente da República:
Respeitosamente,
b)
para autoridades de mesma hierarquia ou de hierarquia inferior:
Atenciosamente,
Ficam
excluídas dessa fórmula as comunicações
dirigidas a autoridades estrangeiras, que atendem a rito e tradição
próprios, devidamente disciplinados no Manual
de Redação do
Ministério das Relações Exteriores.
2.3.
Identificação do Signatário
Excluídas
as comunicações assinadas pelo Presidente da República,
todas as demais comunicações oficiais devem trazer o
nome e o cargo da autoridade que as expede, abaixo do local de sua
assinatura. A forma da identificação deve ser a
seguinte:
(espaço
para assinatura)
Nome
Chefe da Secretaria-Geral da Presidência
da República
(espaço
para assinatura)
Nome
Ministro de Estado da Justiça
Para
evitar equívocos, recomenda-se não deixar a assinatura
em página isolada do expediente. Transfira para essa página
ao menos a última frase anterior ao fecho.
Há
três tipos de expedientes que se diferenciam antes pela
finalidade do que pela forma: o ofício,
o aviso e
o memorando.
Com o fito de uniformizá-los, pode-se adotar uma diagramação
única, que siga o que chamamos de padrão
ofício.
As peculiaridades de cada um serão tratadas adiante; por ora
busquemos as suas semelhanças.
3.1.
Partes do documento no Padrão Ofício
O aviso,
o ofício e
o memorando devem
conter as seguintes partes:
a) tipo
e número do expediente, seguido da sigla do órgão
que o expede:
Exemplos:
Mem.
123/2002-MF Aviso 123/2002-SG Of. 123/2002-MME
b) local
e data em
que foi assinado, por extenso, com alinhamento à direita:
Exemplo:
Brasília,
15 de março de 1991.
c) assunto:
resumo do teor do documento
Exemplos:
Assunto: Produtividade
do órgão em 2002.
Assunto: Necessidade
de aquisição de novos computadores.
d) destinatário: o
nome e o cargo da pessoa a quem é dirigida a comunicação.
No caso do ofício deve ser incluído também
o endereço.
e) texto:
nos casos em que não for de mero encaminhamento de documentos,
o expediente deve conter a seguinte estrutura:
– introdução,
que se confunde com o parágrafo de abertura, na qual é
apresentado o assunto que motiva a comunicação. Evite o
uso das formas: "Tenho
a honra de",
"Tenho
o prazer de",
"Cumpre-me
informar que",
empregue a forma direta;
– desenvolvimento,
no qual o assunto é detalhado; se o texto contiver mais de uma
idéia sobre o assunto, elas devem ser tratadas em parágrafos
distintos, o que confere maior clareza à exposição;
– conclusão,
em que é reafirmada ou simplesmente reapresentada a posição
recomendada sobre o assunto.
Os
parágrafos do texto devem ser numerados, exceto nos casos em
que estes estejam organizados em itens ou títulos e
subtítulos.
Já
quando se tratar de mero encaminhamento de documentos a estrutura é
a seguinte:
– introdução:
deve iniciar com referência ao expediente que solicitou o
encaminhamento. Se a remessa do documento não tiver sido
solicitada, deve iniciar com a informação do motivo da
comunicação, que é encaminhar,
indicando a seguir os dados completos do documento encaminhado (tipo,
data, origem ou signatário, e assunto de que trata), e a razão
pela qual está sendo encaminhado, segundo a seguinte fórmula:
"Em
resposta ao Aviso nº 12, de 1º de fevereiro de 1991,
encaminho, anexa, cópia do Ofício nº 34, de 3 de
abril de 1990, do Departamento Geral de Administração,
que trata da requisição do servidor Fulano de Tal."
ou
"Encaminho,
para exame e pronunciamento, a anexa cópia do telegrama no 12,
de 1o de fevereiro de 1991, do Presidente da
Confederação Nacional de Agricultura, a respeito de
projeto de modernização de técnicas agrícolas
na região Nordeste."
– desenvolvimento:
se o autor da comunicação desejar fazer algum
comentário a respeito do documento que encaminha, poderá
acrescentar parágrafos de desenvolvimento;
em caso contrário, não há parágrafos de
desenvolvimento em aviso ou ofício de mero encaminhamento.
f) fecho (v. 2.2.
Fechos para Comunicações);
g) assinatura do
autor da comunicação; e
h) identificação
do signatário (v. 2.3.
Identificação do Signatário).
3.2.
Forma de diagramação
Os
documentos do Padrão
Ofício devem
obedecer à seguinte forma de apresentação:
a)
deve ser utilizada fonte do tipo Times
New Roman de
corpo 12 no texto em geral, 11 nas citações, e 10 nas
notas de rodapé;
b)
para símbolos não existentes na fonte Times
New Roman poder-se-á
utilizar as fontes
Symbol e Wingdings;
c)
é obrigatória constar a partir da segunda página
o número da página;
d)
os ofícios, memorandos e anexos destes poderão ser
impressos em ambas as faces do papel. Neste caso, as margens esquerda
e direta terão as distâncias invertidas nas páginas
pares ("margem
espelho");
e)
o início de cada parágrafo do texto deve ter 2,5 cm de
distância da margem esquerda;
f)
o campo destinado à margem lateral esquerda terá, no
mínimo, 3,0 cm de largura;
g)
o campo destinado à margem lateral direita terá 1,5 cm;
h) deve
ser utilizado espaçamento simples entre as linhas e de 6
pontos após cada parágrafo, ou, se o editor de texto
utilizado não comportar tal recurso, de uma linha em branco;
i) não
deve haver abuso no uso de negrito, itálico, sublinhado,
letras maiúsculas, sombreado, sombra, relevo, bordas ou
qualquer outra forma de formatação que afete a
elegância e a sobriedade do documento;
j) a
impressão dos textos deve ser feita na cor preta em papel
branco. A impressão colorida deve ser usada apenas para
gráficos e ilustrações;
l)
todos os tipos de documentos do Padrão
Ofício devem
ser impressos em papel de tamanho A-4,
ou seja, 29,7 x 21,0 cm;
m) deve
ser utilizado, preferencialmente, o formato de arquivo Rich
Text nos
documentos de texto;
n)
dentro do possível, todos os documentos elaborados devem ter o
arquivo de texto preservado para consulta posterior ou aproveitamento
de trechos para casos análogos;
o) para
facilitar a localização, os nomes dos arquivos devem
ser formados da seguinte maneira:
tipo
do documento + número do documento + palavras-chaves do
conteúdo
Ex.: "Of.
123 - relatório produtividade ano 2002"
3.3.1.
Definição e Finalidade
Aviso e ofício são
modalidades de comunicação oficial praticamente
idênticas. A única diferença entre eles é
que o aviso é expedido exclusivamente por Ministros de Estado,
para autoridades de mesma hierarquia, ao passo que o ofício é
expedido para e pelas demais autoridades. Ambos têm como
finalidade o tratamento de assuntos oficiais pelos órgãos
da Administração Pública entre si e, no caso do
ofício, também com particulares.
Quanto
a sua forma, aviso e ofício seguem
o modelo do padrão
ofício,
com acréscimo do vocativo,
que invoca o destinatário (v. 2.1
Pronomes de Tratamento),
seguido de vírgula.
Exemplos:
Excelentíssimo
Senhor Presidente da República
Senhora
Ministra
Senhor
Chefe de Gabinete
Devem
constar do cabeçalho ou do rodapé do ofício as
seguintes informações do remetente:
– nome
do órgão ou setor;
– endereço
postal;
– telefone
e endereço de correio eletrônico.
Exemplo
de Ofício
(297
x 210mm)
Exemplo
de Aviso
3.4. Memorando
3.4.1. Definição e Finalidade
O memorando é a modalidade de comunicação entre unidades administrativas de um mesmo órgão, que podem estar hierarquicamente em mesmo nível ou em nível diferente. Trata-se, portanto, de uma forma de comunicação eminentemente interna.
Pode ter caráter meramente administrativo, ou ser empregado para a exposição de projetos, idéias, diretrizes, etc. a serem adotados por determinado setor do serviço público.
Sua característica principal é a agilidade. A tramitação do memorando em qualquer órgão deve pautar-se pela rapidez e pela simplicidade de procedimentos burocráticos. Para evitar desnecessário aumento do número de comunicações, os despachos ao memorando devem ser dados no próprio documento e, no caso de falta de espaço, em folha de continuação. Esse procedimento permite formar uma espécie de processo simplificado, assegurando maior transparência à tomada de decisões, e permitindo que se historie o andamento da matéria tratada no memorando.
Quanto a sua forma, o memorando segue o modelo do padrão ofício, com a diferença de que o seu destinatário deve ser mencionado pelo cargo que ocupa.
Exemplos:
Ao Sr. Chefe do Departamento de Administração Ao Sr. Subchefe para Assuntos Jurídicos
Exemplo
de Memorando
(297
x 210mm)